Durante o percurso do Sandro, desde o jardim de infância, quer antes quer depois do rótulo do diagnóstico ter sido espetado definitivamente na testa dele, foram muitas as vezes que ouvi e vi nos olhos de outra pessoa a desistência. Mesmo que as palavras sejam aparentemente de esperança, alento, os seus olhos dizem: "DESISTO DO TEU FILHO".
E na passada segunda-feira, foi esta a expressão que reconheci no olhar da professora de piano.
Depois de um ano lectivo de esforços, de dias melhores e de dias piores, o resultado não é muito visível, e realmente não me satisfaz. O Sandro perdeu o interesse inicial e eu vi como de dia para dia ele ía tendo menos vontade de sair de casa depois da escola para ir à aula de piano, e menos ainda à de iniciação musical. Vi como a professora ía mostrando cada vez menos entusiasmo - que era transbordante no início - e como as queixas relacionadas com o comportamento dele íam aumentando na proporção inversa. No ar ficou a hipótese de para o ano que vem a motivação dele ser outra. Em mim ficou a decepção de mais uma desistência. Nunca tive a ilusão de que o rapaz me fosse sair um pianista prodigioso, nos dias que correm os sonhos que me permito ter são bastante moderados, grandes mas acessíveis, para não correr o risco de deixar que a frustração acabe com a esperança. Mas agarrei-me ao facto de ele se mostrar interessado numa actividade, esperei que deste interesse resultasse uma série de benefícios para o seu desenvolvimento. Ao nível cognitivo, e também ao nível social, por obrigatoriamente estar em contacto com crianças da mesma faixa etária.
Não sei se os esforços valeram a pena. Tal como acontecia no primeiro e segundo ano, na escola, o contacto com crianças da mesma faixa etária não produziu efeitos positivos, antes pelo contrário. Evidenciou dificuldades e diferenças, prejudicou a auto-estima.
Quando vou buscá-lo à Academia de Música, ultimamente, deparo-me com uma criança que não é o Sandro; reproduz estereotipias que observa nos colegas da sala TEACCH, não fala, adopta comportamentos estranhos e por vezes quase violentos. Numa palavra, imita.
Estou perdida. Neste momento não sei a que me hei-de agarrar. Sinto que estou numa corrida contra o tempo, e me engano constantemente no caminho.
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